Quem tem medo de errar?
Na minha experiência de psicóloga
tenho acompanhado a preocupação quase obsessiva, de grande parte das pessoas,
em fazer o que é certo. Muitas me procuram para eu lhes ensinar a maneira
correta de agir, contudo tento explicar que meu papel não é de conselheira, mas
de facilitadora do processo de se tornarem elas mesmas.
A TEORIA PARADOXAL DA MUDANÇA
Parece absurdo, mas a causa de
nossos problemas psicológicos consiste muitas vezes em não sermos nós mesmos. A
psicoterapia não se guiará pela necessidade de ser diferente, pelo contrário,
sua proposta é reencontrar a nossa essência, o que realmente somos. Quando
formos nós mesmos, mudaremos, não por causa da vontade de fazer o certo e
evitar o errado, mas pela própria natureza humana, que é de mudança,
crescimento e busca de equilíbrio. A isto se chama “teoria paradoxal da
mudança”.
Não estou afirmando que devemos
fazer tudo que vier à cabeça, sem restrições. Claro que a necessidade de
convivermos uns com os outros nos impõe certas regras de conduta que devem ser
respeitadas. Alguns limites devem ser estabelecidos em nome de nossa natureza
gregária, e não poderíamos viver em comunidade, se não houvesse critério de
certo e errado.
Porém o que reflito é sobre o medo
freqüente – quase desesperado – de errar. E por trás deste medo, me parece, um
medo maior ainda de desagradar os outros. Medo de não ser amado, de ficar
sozinho, de ser excluído. Medo que acaba se transformando em angústia e
ansiedade, já que não errar demanda muita energia, atenção total, vigilância
constante. Não me parece que esse tipo de vigilância seja saudável. A longo
prazo, acaba adoecendo qualquer pessoa. Os certinhos demais são famosos por sua
chatice e estresse.
ESTAR VIGILANTE : O CAMINHO DA
CONSCIÊNCIA PLENA
É verdade que Jesus, alicerce moral
de nossa cultura, disse que é necessário “orar e vigiar”, mas disse também que
não devemos nos preocupar com o dia de amanhã, porquanto “a cada dia já basta o
seu mal”. Interessante que tais recomendações, se forem tomadas separadamente,
parecerão contraditórias. Entretanto, são complementares. Estar vigilante pode
ser considerado estar atento a si mesmo, não para não errar, mas para se
conhecer. Saber o que se passa dentro de si em cada situação, sem o olhar
impiedoso do Juiz, mas com a compreensão tolerante do Pai. É o que os budistas
denominam “consciência plena”.
Tal consciência não nasce do medo de
errar, mas do auto amor, da auto aceitação. É preciso muita coragem e vontade
de ser feliz para checar sinceramente as próprias intenções e o que está por
trás das nossas atitudes. Quando tomamos consciência do que realmente nos move,
é que podemos fazer escolhas conscientes e deixar de nos sentir vítimas das
circunstância. Uma vida consciente e não uma vida de medo é que nos impedirá de
sermos tragados pelo roldão das necessidades, dos instintos, dos complexos
desconhecidos.
VIVER SEM MEDO
Por isso não devemos estar
preocupados com o dia de amanhã, estressados na avaliação do certo e do errado.
Se vivermos o aqui-e-agora, cada dia por vez, não teremos tanto medo de errar.
Como estamos atentos, os erros serão realmente fruto da ignorância (não da
irreflexão), e o seu conseqüente aprendizado será bem vindo. Se tivermos medo
de errar, ficando inertes ao invés de agir, retardaremos este aprendizado.
O medo paralisa, e a paralisia
contraria o rumo da vida, que é movimento, mudança. Por isso se adoece de medo,
porque não é possível estancar, sem danos, o fluxo natural da vida. Pânico,
depressão, ansiedade, são todos, em essência, derivados do medo de viver e
sujeitar-se à inconstância da vida. Entretanto, com ou sem medo, a vida
acontece, e por isso, sugiro a todos: arrisquem! Viver é um risco. A vida é
fugaz, mesmo.
Não percamos tempo tendo medo de
errar. Tentemos, antes disso, amar a nós mesmos. Isto nos tornará aptos a amar
os outros sem esforços descomunais. Seja nosso amor o combustível do dia-a-dia.
Erros acontecerão, sem dúvida, mas se temos amor, o perdão se faz presente, o
erro passa, e a chance de acertar ressurge, sempre, generosamente.
Caroline Treigher
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